Wednesday, January 9, 2008

Poema (I)

Sempre gostei deste poema, acho que o segredo está no último verso.


Pirata


Sou o único homem a bordo do meu barco.

Os outros são monstros que não falam,

Tigres e ursos que amarrei aos remos,

E o meu desprezo reina sobre o mar.


Gosto de uivar no vento com os mastros


E de me abrir na brisa com as velas,


E há momentos que são quase esquecimento

Numa doçura imensa de regresso.


A minha pátria é onde o vento passa,

A minha amada é onde os roseirais dão flor,

O meu desejo é o rastro que ficou das aves,

E nunca acordo deste sonho e nunca durmo.


Sophia de Mello Breyner Andresen



2 comments:

A.T. Pereira said...

Este poema é bom. Começo por dizer isto porque podiam não perceber ser esta a minha opinião por causa do que vou dizer a seguir. É que eu não gosto deste poema. Aflige-me. É cru, seco, frio. É solitário e violento. Mas, como diz o Filipe, "é mesmo assim".
Apesar disto, estou convencida que o último verso deve ser das coisas mais bonitas que já se escreveram. É, provavelmente, o meu verso favorito de todos os poemas de todos os autores que já li. Está escrito num post-it colado na prateleira à minha frente. Já mo escreveram em cartas, e-mails, mensagens de telemóvel e recados deixados na secretária. Já o escrevi outras tantas vezes. Está sublinhado e a página em que está encontra-se facilmente, de tanto uso. É especial. =)

P.S.: E uma antiquíssima nostalgia de ser mastro / Baloiça nos pinheiros. Praia

A.T. Pereira said...

Estava (e estou) aqui à espera que me tragam mais literatura para eu ler sobre procedimentos que conheço bem e lembrei-me de vir ver o que se passava por aqui.

E por aqui não se passa nada.

I should've known better porque, convenhamos, se quando eu sou assim um ... vá... bocadinho assertiva e conflituosa, ninguém me dá troco, não era a um comment simpático que alguém ia responder - não é verdade? É.

(Vou começar a encenar diálogos!)